quarta-feira, 3 de abril de 2013



Não perde um dia, mas dorme todos

Há tempos os olhares se cruzavam, de intenso e profundo breu era o brilho dos pares de olhos. Os lábios se mantinham imóveis com contornos de mistérios. Discretamente as cabeças se mexiam para o lado interessante, a fim de permitir visualizar o que causava tais calafrios e disparos dos corações.

Foi assim por um longo período. Nos corredores. Salas idealmente grandes, e concretamente pequenas.
Nas duas ou três oportunidades de partilharem um mesmo grupo, as surpresas eram imensas, e o já visto era bem conhecido. Contornos da face, trejeitos, forma de andar, postura, o cabelo jogado caindo sobre a face, a cor da mochila sempre cheia nas costas, os atrasos recorrentes.

Os já vistos eram conhecidos, e as surpresas passaram a dominar, causavam tristeza e alegria. A capacidade de compreender as defasagens de coisas próprias, o sorriso e lado a lado sempre constante com os amigos, o perceber concreto da ilicitude da sociedade. Como os olhos carregavam coragem. E por fim o que causavam mais inquietude: a suave força de sua voz.
Essa inquietude era reprimida, e essa admiração potencializada. Os campos eram de espinhos, não havia morangos. Os espinhos eram sabidos duvidosamente, duvidosamente eram sabidos. Que alívio torturante. Que tortura o tocar de mãos.
Passava a ser constantemente alegre esta tristeza.
Tornou-se constante. CONSTANTEMENTE. Algumas muitas vezes por semana. As trocas de palavras, olhares, discussões, toques, construções, lutas.

Em vozes reunidas e movimentos, defendendo-se e buscando, concretizavam-se as opiniões formadas a respeito de um e outro.
As horas e dias passavam, e as mãos entrelaçaram-se discretamente e desejadamente. Querendo afastar-se.
Fizeram-se campos de rosas, com borboletas, com poesia, suor, gritos, corações.
Fizeram-se sofás entediantes, com tentativas de serem interessantes. Dias e noites, novos e velhos, velhos e metódicos, novos e doces e quentes.
E mais horas e dias passavam. Complicações.

Os olhos cruzaram aleatoriamente nas salas e corredores. Os calafrios e disparos eram substituídos por camas calmamente ocupadas, de braços dados e olhos fechados. De corpo quente, sempre quente, e mãos suadas, sempre suadas. Ninguém disse nada.
Os dias e noites eram de 24 horas, parecendo ter 5 minutos em alguns momentos, como aquele dia de sorrisos e afagos, ou de 36 horas, como aquela noite entediante e raivosa. Estranho.
E os olhos não se queriam mais, embora se desejassem.
Veio a chuva fria e tempestuosa, não era musical, era cortante. Um se foi em outros braços e brilhos. Um ficou na multidão sozinhamente acompanhado.

Seriam cheias de momentos as palavras, se não fossem estranhamente medrosos e contraditoriamente apaixonados.
Não perdia um dia, mas dormia todos.
O suave suor a molhar a pele, o sorriso amarelo a ser exibido, a voz cansativa a soar, o carinhoso toque de carícia, o sono constante. SONHOS.
Sonhos advindos do sono dormido, da vontade de mudança, REVOLUÇÃO, desejada.
Viagens, discussões, reuniões, filmes, piadas, bebidas, brigas, conquistas, AR, ER, IR e OR.
COMPOR.
COMPOR poesias, versos, contos, sonhos, revolução.
COMPOR gritos, movimentações, lutas, revolução.
Caronas diversas para apreender e locomover. Umas que deram medo, renderam temores e um forte abraço no fim. Outras que renderam sonecas, amizades, contatos e divulgação das ideias. Cansaço.
Quereres ser um poeta, uma poetisa, um revolucionário, uma revolucionária. Juntos, sós.
Estando juntos, querendo sós. Estando sós querendo juntos. Juntos – juntos. Sós – sós. “Junsos”. Neologismo.
Em um lugar redondo não era tudo vivido, só quando fosse quadrado. Quando o enjoo e estômago recusassem. Quando se perdessem dias, e não dormisse nenhum.

Nenhum comentário:

Postar um comentário